Alegando corte de repasses, entidades sociais ameaçam parar em Ribeirão

Sara Alves conta que após iniciarem o curso de marcenaria em uma entidade assistencial de Ribeirão Preto (SP), os dois irmãos deixaram as ruas, conquistaram uma profissão e mudaram de vida. Inspirada neles, a estudante procurou o mesmo projeto em busca de profissionalização. “Sem a marcenaria, eu nem sei o que seria da nossa família”, diz.

ONGs estão cortando alunos de educação infantil e cursos profissionalizantes, Prefeitura nega redução nas verbas e diz que reajuste foi acima da inflação.

A continuidade do curso gratuito de Sara, no entanto, está ameaçada. A instituição anunciou que deixará de atender 112 dos 160 alunos matriculados, devido à redução do repasse mensal feito pela Prefeitura. A situação é enfrentada por outras entidades sociais, que também ameaçam fechar as portas no próximo ano.

“As contas estão no limite. O que tinha de reserva está sendo usado, está no final. Há mais de 20 anos a gente realiza esse trabalho, é o único desse tipo em Ribeirão. É uma pena saber que, a qualquer momento, podemos parar”, afirma Romualda Andrade, presidente da Escola de Marcenaria Santo Antônio Maria de Claret.

Romualda explica que a organização, fundada em 1979, recebia R$ 147 mil da administração municipal todos os meses, mas o valor foi reduzido para R$ 60 mil. Além disso, três educadores – cujos salários eram assumidos pela Prefeitura – também foram dispensados. “Estamos mantendo eles com a verba que ainda tem em caixa, mas está acabando”, diz.


Creches fechadas
A quadra de esportes vazia, no bairro Jardim Marchesi, denuncia que outra entidade também está suspendendo os atendimentos. Em novembro, a Sociedade Beneficente Evangélica de Ribeirão Preto (Soberp) deixou de atender 75 das 183 crianças e adolescentes matriculados no ensino infantil e no projeto “Aprendiz”.

O presidente Láercio Galvan explica que a decisão de reduzir o número de assistidos foi tomada porque o repasse mensal de R$ 24 mil feito pela Prefeitura, pelo Estado e pela União, não está sendo suficiente para cobrir os gastos fixos, que chegam a R$ 55 mil por mês.

“Não é só tristeza, mas decepção. É uma falta de apoio efetivo do sistema governamental. O recurso sempre é insuficiente. Existem meninos que não estão mais estudando aqui, mas ocupam o nosso espaço para ter uma atividade de lazer no final da tarde”, afirma.


Repasse menor
A mesma dificuldade é enfrentada pela presidente do Núcleo Assistencial e Educacional Sonho Real, Cláudia de Paula Wolf, afirmando que também deixará de atender as crianças matriculadas na educação infantil, a partir de 2016. Ao todo, 75 meninos e meninas de 3 a 5 anos ficarão sem orientação pedagógica.

Cláudia explica que a Prefeitura de Ribeirão recebe do Governo Federal R$ 320 por criança, por meio do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Entretanto, o valor não é repassado integralmente às creches e escolas infantis. Segundo ela, as entidades recebem em torno de R$ 159.

“Nós estamos negociando há dois anos com a Secretaria da Educação, por conta do valor do repasse. Ele é muito abaixo, inviável pelo valor que temos de custo per capita para manter o trabalho. Não conseguimos chegar a um acordo e não temos condições de continuar”, diz.

Na última quinta-feira (5), representantes de entidades assistenciais e de ONGs participaram da sessão na Câmara Municipal, pedindo apoio aos vereadores para solucionar a questão. O grupo saiu da Casa, porém, sem saber quais medidas serão tomadas pelos parlamentares.


Ná há atraso
Em nota, a Secretaria Municipal da Educação informa que possui 36 entidades sociais cadastradas e negou que haja redução ou atraso nos repasses, assim como previsão de suspensão das verbas. Segundo a administração, ao contrário das queixas, os valores vêm sendo corrigidos acima da inflação dos últimos sete anos.

“A inflação acumulada de 2008 a 2015, segundo o INPC do IBGE, foi de 61,39%, enquanto os valores reajustados no período de 2009 a 2015 foram de 272,59%. Ou seja, em 2008, era pago R$ 66,00 por criança/mês e, em 2015, esse valor foi de R$ 245,70. Nessa conta não está sendo considerado o reajuste já definido para 2016, que será de 13%. Sendo assim, o valor passará para 277,64 por criança/mês”, consta no comunicado.

Ainda de acordo com a Prefeitura, as duas entidades que encerraram os serviços em 2015 não deixaram de receber recurso municipal, mas fecharam as portas “por decisão de suas respectivas diretorias.”

“Embora haja atraso do repasse proveniente do Governo Federal, a Prefeitura Municipal vem se esforçando para honrar este compromisso, para que as entidades não tenham prejuízos na execução dos serviços ofertados”, diz a nota.


Fonte: http://g1.globo.com